Relator: Jorge Luís Dall'Agnol
Tema(s): Pacto antenupcial Casamento Regime de separação total de bens
Tribunal TJRS
Data: 26/02/2015
JLD
Nº 70062618301 (Nº CNJ: 0454393-09.2014.8.21.7000)
2014/Cível
EMBARGOS INFRINGENTES. AÇÃO DE SEPARAÇÃO JUDICIAL LITIGIOSA. CASAMENTO. REGIME DE SEPARAÇÃO TOTAL DE BENS. PACTO ANTENUPCIAL. É considerado válido o contrato realizado entre partes maiores e capazes. Ausência de vício capaz de invalidar o pacto. Manutenção do acordo de vontade. Inaplicabilidade da Súmula 377 do STF.
Embargos infringentes desacolhidos. Unânime.
Embargos Infringentes
Quarto Grupo Cível
Nº 70062618301 (Nº CNJ: 0454393-09.2014.8.21.7000)
Comarca de Salto do Jacuí
D.M.N.L.
..
EMBARGANTE
P.J.L.
..
EMBARGADO
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Magistrados integrantes do Quarto Grupo Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em desacolher os embargos infringentes.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des. Luiz Felipe Brasil Santos, Des. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, Des.ª Liselena Schifino Robles Ribeiro, Des. Alzir Felippe Schmitz, Des.ª Sandra Brisolara Medeiros, Des. Ricardo Moreira Lins Pastl e Dr. José Pedro de Oliveira Eckert.
Porto Alegre, 12 de dezembro de 2014.
DES. JORGE LUÍS DALL'AGNOL,
Presidente e Relator.
RELATÓRIO
Des. Jorge Luís Dall'Agnol (PRESIDENTE E RELATOR)
Trata-se de embargos infringentes opostos por D.M.N.L., nos autos da ação de separação judicial litigiosa cumulada com separação de corpos e alimentos provisionais proposta contra P.J.L., contra o acórdão das fls. 828/852, no qual, por maioria, foram rejeitadas as preliminares e, no mérito, provido o recurso de apelação, vencido o Des. Rui Portanova.
Segundo se depreende do acórdão em voga, a Câmara reconheceu a validade do pacto antenupcial firmado pelas partes que estabelecia o regime de separação total de bens, ao passo que o Des. Rui Portanova, Relator, mantinha a sentença que determinou a partilha dos bens amealhados na constância da união.
Em resumo, argumenta a recorrente que deve ser confirmado o voto vencido, estando caracterizada a existência de uma sociedade de fato, onde o casal trabalhou junto no intuito de somar patrimônio. Refere que não deve prevalecer o princípio do pacta sunt servanda, tendo em vista que esse cedeu sua notoriedade de lei para a socialização do direito. Aduz a aplicação ao caso da Súmula 377 do STF, acrescentando que o depoimento das partes e das testemunhas corrobora a sentença e o voto vencido. Pugna, ao final, pelo acolhimento dos infringentes (fls. 856/862).
Ao apresentar contrarrazões, o embargado sustenta que deve ser obedecida a vontade das partes expressa no contrato pré-nupcial, que, no caso, previu a incomunicabilidade dos bens. Destaca a inaplicabilidade da Súmula 377 do STF, visto que não se está diante de separação legal, obrigatória de bens, mas sim de separação convencional. Colaciona entendimento jurisprudencial acerca da matéria. Requer o desacolhimento dos embargos infringentes. (fls. 866/874).
O Ministério Público opinou pelo desacolhimento (fls. 879/884).
Registre-se, por fim, que foi cumprido o comando estabelecido pelos artigos 549, 551 e 552, todos do CPC.
É o relatório.
VOTOS
Des. Jorge Luís Dall'Agnol (PRESIDENTE E RELATOR)
A controvérsia se limita à aplicação, ou não, do pacto antenupcial realizado entre as partes (fl. 12), onde convencionado que o regime de bens a vigorar após o casamento seria o da separação total de bens, compreendendo a incomunicabilidade do patrimônio que cada um possuía no momento da celebração, bem como aqueles adquiridos na constância do casamento.
Coaduno do entendimento firmado pela maioria da Câmara, onde reconhecida a validade do contrato entre os nubentes, inexistindo prova de que tenha havido qualquer tipo de vício, capaz de invalidá-lo.
A simples alegação de que a embargante contava com 22 anos à época em que firmado o pacto, ao passo que o embargado contava com 37, não é razão suficiente para afastar a sua validade. Verifica-se que ambos se encontravam em pleno gozo de suas capacidades, estando a embargante ciente das conseqüências de sua escolha.
Assim, tratando-se de partes maiores e capazes, as quais elegeram o regime de bens de forma convencional, respeitando os ditames legais, não há falar em vício de qualquer espécie, devendo ser mantido o pacto celebrado.
No que concerne ao pedido de aplicação da Súmula 377 do Supremo Tribunal Federal, melhor sorte não socorre à embargante.
Assim dispõe a referida Súmula: “No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento”. Da leitura, evidenciado que sua aplicação restringe-se aos casos em que a separação é legal, obrigatória de bens, e não separação convencional, como o caso dos autos.
No mesmo sentido, aliás, o parecer ministerial, da lavra do Dr. Procurador de Justiça, Dr. Marcelo Liscio Pedrotti, cabendo transcrever, a fim de evitar desnecessária repetição:
(...)
Do cotejo dos autos, observa-se que as partes, em 11/12/1993, contraíram núpcias, consoante faz prova a certidão de casamento da fl. 09. Antes da celebração do matrimônio, em 24/11/1993, os nubentes dirigiram-se ao Cartório de Salto do Jacuí e firmaram Escritura Pública de Pacto Antenupcial (fls. 10/11), onde ficou registrado que:
“(...) E, pelos outorgantes e reciprocamente outorgados, me foi dito que tendo contratado o seu casamento, conforme habilitação desta data e deste Ofício, optaram, na forma permitida pela legislação atual pelo regime de separação de bens; que, por esta escritura e na melhor forma de direito, convencionam, como de fato ora convencionado têm, que o regime de bens a vigorar, entre eles, após a realização de suas núpcias, seja o da comunhão, digo, o da separação de bens, regime este que compreende a incomunicabilidade do patrimônio que cada um dos nubentes possui atualmente, bem como, daquele a ser adquirido na constância do casamento; que renunciam ao regime da comunhão parcial de bens, estabelecida na legislação vigente, do que dou fé”.
Embora tenha o voto vencido ventilado a possibilidade de relativização dos efeitos do pacto antenupcial celebrado, diante do fato de ostentar a embargante, à época do casamento, pouca idade (22 anos), bem como em virtude do fato de ter saído da união com patrimônio relativamente inferior àquele pertencente ao embargado, tem-se que inexistem motivos para ser negada a eficácia do acordo firmado.
E isto porque, a escolha do regime de bens que irá reger a união se encontra intimamente relacionada com a autonomia de vontade dos nubentes.
O regime de separação total de bens determina que cada um possui o seu próprio patrimônio, que não se comunica com aquele de titularidade do parceiro. Para que tal disposição seja invalidada, exige-se prova cabal acerca da existência de vício no momento da expressão do ato, apresentando-se como insuficiente a mera suposição da ocorrência de esforço comum para a aquisição de patrimônio na constância do casamento.
O caderno de provas coligado aos autos, especialmente o depoimento pessoal das partes, bem como das testemunhas arroladas (fls. 161/181, 318, 361, 368 e 384/385) efetivamente demonstra que a embargante trabalhava conjuntamente com o embargado. Todavia, também comprova que todos os serviços por si prestados eram remunerados, mormente diante da sua condição de sócia da empresa, ainda que minoritária.
Igualmente, embora alegue ter sido prejudicada pela forma em que partilhados os bens, deve-se destacar que, no início do matrimonio, não possuía qualquer patrimônio em seu nome (fl. 11), ao passo que, após a separação do casal, passou a ostentar a titularidade de 07 (sete) imóveis e 03 (três) veículos. Certamente tal aumento material decorreu da sua atividade profissional, bem como da sua participação na empresa, sendo evidente que, pelos serviços prestados em conjunto com o seu ex-esposo, recebia a devida contraprestação.
Ademais, o embargado, antes mesmo do casamento, já era detentor de considerável patrimônio (fls. 10/11), fato que, certamente, facilitou a aquisição de novos bens em seu nome, bem como favoreceu para que terminasse a união com um rol maior do que aquele amealhado pela recorrente.
Assim, não tendo sido comprovado o suposto locupletamento do recorrido com os esforços de sua ex-esposa, entende-se que devem ser obedecidas as disposições constantes no pacto antenupcial que estipulou o regime da separação total de bens.
Outrossim, cumpre destacar ser descabida a incidência da Súmula 377 do Supremo Tribunal Federal, que assim preconiza, in verbis:
Súmula 377. No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento.
Aludido diploma aplica-se apenas nas hipóteses constantes no art. 1.641 do Código Civil, ou seja, (a) quando a pessoa necessitar de suprimento judicial, isto é quando postas sob tutela ou curatela, (b) quando não observar qualquer das causas suspensivas, que eram os antigos impedimentos impedientes, e (c) quando qualquer dos nubentes contar mais de sessenta anos. Tais circunstâncias, todavia, não estão presentes no caso concreto.
Nesse sentido é o entendimento do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE CONVERSÃO DE SEPARAÇÃO EM DIVÓRCIO PARTILHA. REGIME DE SEPARAÇÃO DE BENS. PACTO ANTENUPCIAL. ABRANGÊNCIA. PARTILHA. DESCABIMENTO. Descabe estabelecer partilha de bens ou mesmo qualquer indenização quando os litigantes adotaram o regime matrimonial da separação total de bens, convencionada através de pacto antenupcial, no qual estabeleceram expressamente a abrangência dos bens havidos a qualquer título durante a constância do casamento, não tendo incidência, portanto, o teor da Súmula nº 377 do STF. RECURSO DESPROVIDO. (Apelação Cível Nº 70044097426, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Roberto Carvalho Fraga, Julgado em 24/04/2012)
SEPARAÇÃO JUDICIAL. UNIÃO ESTÁVEL ANTERIOR. PARTILHA. REGIME DA SEPARAÇÃO CONVENCIONAL DE BENS. PACTO ANTENUPCIAL. DESCABIMENTO. Descabe estabelecer partilha de bens ou mesmo qualquer indenização quando o regime matrimonial adotado pelos litigantes foi o da separação total de bens, convencionada através de pacto antenupcial, não tendo incidência, portanto, o teor da Súmula nº 377 do STF. Recurso desprovido, por maioria. (Apelação Cível Nº 70020214334, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, Julgado em 24/10/2007)
De fato, constitui entendimento pacífico que, enquanto o casal estiver junto, o produto do trabalho de ambos deve a eles pertencer de forma igualitária, mas isso se não houver manifestação de vontade expressa em sentido contrário (pacto antenupcial, no casamento).
Nesses termos, desacolho os embargos infringentes.
Des. Luiz Felipe Brasil Santos (REVISOR) - De acordo com o Relator.
Des. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves - De acordo com o Relator.
Des.ª Liselena Schifino Robles Ribeiro - De acordo com o Relator.
Des. Alzir Felippe Schmitz - De acordo com o Relator.
Des.ª Sandra Brisolara Medeiros - De acordo com o Relator.
Des. Ricardo Moreira Lins Pastl
Acompanho o em. relator, também desacolhendo os embargos infringentes, renovando nesta oportunidade o voto que lancei quando do julgamento pela Câmara.
Dr. José Pedro de Oliveira Eckert - De acordo com o Relator.
DES. JORGE LUÍS DALL'AGNOL - Presidente - Embargos Infringentes nº 70062618301, Comarca de Salto do Jacuí: "DESACOLHERAM OS EMBARGOS INFRINGENTES. UNÂNIME."
Julgador (a) de 1º Grau: JULIANA PASETTI BORGES
Disponível na Jurisprudência do IBDFAM, do Dia 26 de Fevereiro de 2015