Relator: Raul Araújo
Tema(s): Partilha amigável Arrolamento Violação Anulação
Tribunal STJ
Data: 19/01/2015
RECURSO ESPECIAL Nº 803.608 - MG (2005⁄0203859-0)
RELATOR : MINISTRO RAUL ARAÚJO
RECORRENTE : WARLEY DE ARAÚJO E OUTROS
ADVOGADO : MARIA HELENA DO CARMO E OUTRO
RECORRIDO : MÁRCIO PEREZ E OUTROS
ADVOGADO : CAMILO EUSTÁQUIO REZENDE LIMA
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL E SUCESSÕES. PARTILHA AMIGÁVEL E PARTILHA JUDICIAL. ARROLAMENTO. AÇÃO ANULATÓRIA DE PARTILHA. POSSIBILIDADE (CPC, ART. 1.031). VIOLAÇÃO CARACTERIZADA. RECURSO PROVIDO.
1. Analisando a sentença e o v. acórdão estadual, que divergem ao interpretar a forma de partilha, é forçoso reconhecer a ocorrência de partilha amigável, pois presentes os seus requisitos.
2. A partilha amigável (CC⁄1916, art. 1.773; CC⁄2002, art. 2.015) é passível de anulação, nos termos dos arts. 486, 1.029 e 1.031 do CPC, enquanto a partilha judicial é rescindível, conforme preconizam os arts. 485 e 1.030 do CPC.
3. No caso em liça, ocorrida a partilha amigável, cabível é a ação de anulação da partilha. Assim, o pedido posto na exordial não é juridicamente impossível, motivo pelo qual deve ser reformado o v. acórdão estadual, reconhecendo-se não caracterizada a carência da ação.
4. Recurso especial provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Quarta Turma, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Maria Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira, Marco Buzzi e Luis Felipe Salomão votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília, 25 de março de 2014 (Data do Julgamento)
MINISTRO RAUL ARAÚJO
Relator
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
QUARTA TURMA
Número Registro: 2005⁄0203859-0
PROCESSO ELETRÔNICO
REsp 803.608 ⁄ MG
Números Origem: 10024010964401 24010964401 24896217924
PAUTA: 20⁄03⁄2014
JULGADO: 20⁄03⁄2014
Relator
Exmo. Sr. Ministro RAUL ARAÚJO
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro RAUL ARAÚJO
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. DURVAL TADEU GUIMARÃES
Secretária
Bela. TERESA HELENA DA ROCHA BASEVI
AUTUAÇÃO
RECORRENTE : WARLEY DE ARAÚJO E OUTROS
ADVOGADO : MARIA HELENA DO CARMO E OUTRO
RECORRIDO : MÁRCIO PEREZ E OUTROS
ADVOGADO : CAMILO EUSTÁQUIO REZENDE LIMA
ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Sucessões - Inventário e Partilha
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia QUARTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
Adiado por indicação do Sr. Ministro Relator.
RECURSO ESPECIAL Nº 803.608 - MG (2005⁄0203859-0)
RELATOR : MINISTRO RAUL ARAÚJO
RECORRENTE : WARLEY DE ARAÚJO E OUTROS
ADVOGADO : MARIA HELENA DO CARMO E OUTRO
RECORRIDO : MÁRCIO PEREZ E OUTROS
ADVOGADO : CAMILO EUSTÁQUIO REZENDE LIMA
RELATÓRIO
EXMO. SR. MINISTRO RAUL ARAÚJO: Trata-se de recurso especial interposto por WARLEY DE ARAÚJO e OUTROS, com fundamento na alínea "a" do permissivo constitucional, contra v. acórdão proferido pelo eg. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais (TJ-MG).
Narram os autos que WARLEY DE ARAÚJO e OUTROS ajuizaram "ação anulatória de partilha", com arrimo nos arts. 86 e 1.805 do Código Civil de 1916, em desfavor de MÁRCIO PEREZ LIMA e OUTROS, sob o argumento de que são filhos (herdeiros legítimos) do Sr. JOSÉ DE LIMA e que teriam sido preteridos no processo de inventário dos bens do de cujus.
Em sentença às fls. 149-150, julgou-se procedente o pedido, assentando o il. magistrado de piso que ficara "(...) comprovada a preterição dos herdeiros na sentença homologatória da partilha dos bens deixados por José Lima, nos autos do inventário (apenso), mister o reconhecimento de sua nulidade, a fim de que seja outra elaborada, com a inclusão dos autores a título de herdeiros preteridos" (fl. 50).
Inconformados, MÁRCIO PEREZ LIMA e OUTRA interpuseram apelação, a qual foi provida pelo eg. TJ-MG, nos termos do v. acórdão assim ementado (fl. 174):
"Apelação cível. Ação de anulação de partilha. Adjudicação judicial. Impossibilidade jurídica do pedido presente. Processo extinto de oficio sem julgamento do mérito. 1. A possibilidade jurídica do pedido consiste em existir, na ordem jurídica, tutela jurisdicional para o conflito de interesses levado ao Poder Judiciário. 2. São inconfundíveis as partilhas amigável e judicial. A primeira está sujeita a eventual invalidação enquanto a segunda somente pode ser rescindida. 3. A ordem jurídica brasileira nega tutela jurisdicional, via ação anulatória, para invalidar a adjudicação judicial de bens em inventário, que é sucedânea de partilha judicial. A pretensão, portanto, é juridicamente impossível. 4. Apelação cível conhecida e, de oficio, decretada a extinção do processo sem julgamento de mérito."
Irresignados, WARLEY DE ARAÚJO e OUTROS manejaram o presente recurso especial alegando violação ao art. 1.031 do CPC, sob o fundamento de que"(...) não houve partilha judicial, como quer o venerando acórdão. Ao contrário, a adjudicação apenas formalizou a partilha amigável (...)" (fl. 184).
Aduzem, também, que o v. aresto estadual "(...) discordou, frontalmente, do artigo 1.031 e parágrafos do Código de Processo Civil, que equiparou a sentença de homologação de partilha e adjudicação, como elementos da partilha amigável. Além do que, o referido acórdão contrariou até a vontade das partes envolvidas no inventário, que elegeram o rito do arrolamento para partilha dos bens deixados pelo pai" (fl. 187).
Oferecidas contrarrazões às fls. 194-197.
Instado a se manifestar, o d. Ministério Público Federal opinou pelo parcial conhecimento do recurso especial e, nessa parte, pelo seu provimento, nos termos do parecer (fls. 207-211), da lavra do em. Subprocurador-Geral da República, Dr. Pedro Henrique Távora Niess.
É o relatório.
VOTO
EXMO. SR. MINISTRO RAUL ARAÚJO (Relator): Conforme relatado, a eg. Corte Estadual, de ofício, extinguiu a ação anulatória (CPC, 267, VI) porque entendeu ausente uma das condições da ação, qual seja a possibilidade jurídica do pedido. A título elucidativo, é conveniente transcrever o seguinte excerto do v. acórdão estadual (fls. 175-178):
"Conforme se vê à fl. 24, os bens deixados pelo falecido foram adjudicados à viúva em 03.06.92, diante da renúncia dos herdeiros.
Sem dúvida, não existiu partilha. Mas, ainda que existisse, necessário se torna traçar distinções. Ocorre que existem dois tipos de partilha: a amigável e a judicial. A primeira pode ser invalidada, o que não ocorre com a segunda, porque é somente rescindível. Eis, neste sentido, a lição de Orlando Gomes, em obra atualizada por Humberto Theodoro Júnior, Sucessões, 8. ed., Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 297:
Não há confundir as duas hipóteses. A partilha amigável é um negócio jurídico, que não perde a sua natureza com a homologação judicial. De resto, pode toda sentença homologatória ser resilida como os negócios jurídicos em geral, e, pela mesma razão, a anulação do ato homologatório acarreta a sua ineficácia, virtude não tendo, como não tem, para validar contrato defeituoso por vício de consentimento. De resto, é ato jurisdicional tão-somente na forma. A ação anulatória de partilha amigável prescreve em um ano, contado o prazo, se a causa tiver sido a coação, do dia em que tiver cessado, de qua o houver acabado a incapacidade, se intervém incapaz, e da data de sua assinatura, no caso de dolo ou de erro.
A partilha judicial não é anulável; é rescindível, vale dizer que só perde a eficácia por outra sentença proferida em ação rescisória fundada, em principio, nos pressupostos específicos, dado que o preceito autorizante abre exceção à regra geral. O prazo para propô-la é de dois anos, entendendo-se que é de decadência. Trata-se de prazo gritantemente curto para invalidar sentença que, por exemplo, pretere herdeiro ou inclui numa partilha quem não o é. Verdade é que o herdeiro preterido, sendo terceiro em relação à sentença, tem vinte anos para intentar a ação de petição de herança.
Observe-se, por último, que não está excluída a ação de nulidade de partilha, admissível, todavia, na partilha amigável, como prevista a sanção para os negócios jurídicos em geral.
É claro que a adjudicação é o sucedâneo da partilha judicial. Portanto, não é o caso de invalidá-la, o que torna juridicamente impossível o pedido.
(...)
Há possibilidade jurídica do pedido quando a pretensão, em abstrato, se inclui entre aquelas que são reguladas pelo direito objetivo.
Assim, os apelados são carecedores de ação por impossibilidade jurídica do pedido, insista-se, por inexistir partilha amigável a ser invalidada.
Com estes fundamentos, declaro, de ofício, os apelados carecedores de ação por impossibilidade jurídica do pedido e decreto a extinção do processo sem julgamento de mérito com lastro no art. 267, VI, do CPC. Ficam invertidos os ônus da sucumbência, inclusive as custas recursais, respeitado o disposto na Lei nº 1.060 de 1950."
Os recorrentes, por sua vez, sustentam que o entendimento ora externado viola o art. 1.031 do CPC, in verbis:
"Art. 1.031. A partilha amigável, celebrada entre partes capazes, nos termos do art. 1.773 do Código Civil, será homologada de plano pelo juiz, mediante a prova da quitação dos tributos relativos aos bens do espólio e as suas rendas, com observância dos arts. 1.032 a 1.035 desta Lei.
Parágrafo único. O disposto neste artigo se aplica, também, ao pedido de adjudicação, quando houver herdeiro único." (Redação dada pela Lei 7.019⁄1982, posteriormente alterada para a redação atual, nos termos da Lei 11.441⁄2007) Nesse jaez, é mister destacar, também, o seguinte excerto da sentença, reformada pelo v. acórdão recorrido (fl. 150):
"Nos termos do disposto no art. 1.030 CPC, é rescindível a partilha se houve preterição de algum herdeiro. No caso vertente, os autores provaram que são filhos do autor da herança (fls.08⁄10), cujo inventário e partilha, dos quais não participaram, encontram-se findos.
Assim, restando comprovada a preterição dos herdeiros na sentença homologatória da partilha dos bens deixados por José Lima, nos autos do inventário (apenso), mister o reconhecimento de sua nulidade, a fim de que seja outra elaborada, com a inclusão dos autores a título de herdeiros preteridos.
Quanto aos bens" doados "pelo falecido e sua esposa aos seus descendentes, ora réus, com reserva de usufruto e posterior renúncia destes aos quinhões hereditários em favor da cônjuge meeira, importam em adiantamento da legitima e, para que outros herdeiros não fiquem prejudicados, estão sujeitos à colação no inventário do ascendente comum."
Vale, neste momento, destacar as lições de ARNOLD WALD sobre a partilha:
"A partilha é a repartição ou distribuição dos bens do falecido e tem efeitos meramente declaratórios, pois os haveres do de cujos transferem-se aos herdeiros com o falecimento e independentemente da partilha, que se limita a esclarecer os pertences de cada um.
(...)
Quanto à forma, a partilha pode ser amigável ou judicial, podendo, também, decorrer de decisão do de cujus antes de sua morte. Será amigável quando todos os herdeiros forem capazes e houver acordo unânime entre eles (CC, art. 2015). Será, ao contrário, judicial quando houver herdeiro incapaz ou inexistir acordo unânime entre herdeiros capazes (CC, art. 2.026). A existência de testamento em nada impede a execução de partilha amigável. Esta poderá ser feita por escritura pública, independendo de homologação do magistrado, ou por instrumento particular, sendo necessária a homologação judicial. Poderá, ainda, ser feita por termo nos autos (CPC, art. 1.029).
(...)
A Lei n. 7.019, de 31-8-1982, introduziu inovações importantes no procedimento de inventário e partilha, dando-lhe maior rapidez. A alteração substancial consistiu na nova redação da seção relativa ao arrolamento, para adaptá-la ao objetivo central da lei.
(...)
É importante frisar que o inventário na forma de arrolamento se aplica quando houver partilha amigável celebrada entre as partes capazes, por escritura pública, termos nos autos do inventário, ou escrito particular, homologado pelo juiz (CC, art. 2.015). Se não houver a partilha amigável, o inventário e a partilha processar-se-ão pelos outros dispositivos do Código de Processo Civil.
Havendo a partilha amigável, na petição de inventário será indicado o inventariante, por designação dos herdeiros. Também serão indicados os bens com os respectivos valores. De tudo não haverá lavratura de termos (inventariante). Não há avaliação dos bens, como ocorre na hipótese do art. 1.003 do Código de Processo Civil."
(In Direito Civil: direito das sucessões, vol 6 - 15ª ed. - São Paulo: 2012, pp. 342-348)
Analisando a sentença e o v. acórdão estadual, que divergiram ao interpretar a petição de fls. 19-21, infere-se que, com efeito, ocorreu a partilha amigável, uma vez que os recorridos provocaram o Poder Judiciário apresentando testamento deixado pelo Sr. José Lima, noticiaram que os filhos, ora recorridos, do de cujus destinaram suas respectivas heranças para a viúva Sra. DEOLINDA PEREZ LIMA, a quem indicam como inventariante e, ainda, requereram a adoção do rito do arrolamento, nos termos do art. 1.031 do CPC. Indicaram, também, os bens do de cujus.
Assim, com arrimo na doutrina ora homenageada e no art. 1.773 do Código Civil de 1916 (correspondente ao art. 2.015 do Código Civil de 2002), é forçoso reconhecer que ocorreu partilha amigável, ao contrário do assentado no v. acórdão estadual.
Impende destacar, também, que, ao contrário do alegado pelos ora recorridos em sede de contrarrazões, o exame do presente apelo nobre não encontra óbice na Súmula 7⁄STJ, pois o reconhecimento da violação ao art. 1.031 do CPC não decorre do reexame de matéria fático-probatória, mas, sim, do confronto entre o v. acórdão vergastado e a sentença de fls. 149-150.
Assim, reconhecida a aludida partilha amigável, é imperioso destacar da doutrina civilista o posicionamento doutrinário de SEBASTIÃO AMORIM e EUCLIDES DE OLIVEIRA acerca do procedimento para sua anulação:
"Conforme artigo 1.029 do Código de Processo Civil, a partilha amigável, lavrada em instrumento público, reduzida a termo nos autos do inventário ou constante de escrito particular homologado pelo juiz, pode ser anulada por dolo, coação, erro essencial ou intervenção de incapaz.
(...)
Dispõe o artigo 486 do código de Processo Civil que"os atos judiciais que não dependem de sentença, ou em que esta for meramente homologatória, podem ser rescindidos, como os atos jurídicos em geral, nos termos da lei civil.
(...)
A ação de rescisão de partilha, cuidada no artigo 1030 do Código de Processo Civil, processa-se perante o Tribunal, conforme regulamentado no artigo 485 e seguintes do Código de Processo Civil, havendo que interpor-se no prazo de dois anos.
No entanto, é preciso distinguir situações de sentença meramente homologatória, ainda que não decorrente de partilha amigável, isto é, quando a sentença limita-se a julgar os termos do esboço organizado, inocorrendo litigiosidade entre os sucessores. Nesse caso, a rescisão a que alude o artigo 1.030 do Código de Processo Civil nada tem a ver com a rescisória propriamente dita, mas diz respeito à anulação de ato homologado, regrando-se de forma símile às hipóteses do pré-citado artigo 1.029, ou seja, no mesmo prazo e perante o mesmo juízo.
Em comentário ao artigo 486 do Código de Processo Civil, cuja hermenêutica há de ser conjugada com os artigos 1.029 e 1.030 do mesmo ordenamento, ressalta o iminente processualista Jose Carlos Barbosa Moreira que o dispositivo em verdade não se refere à ação rescisória de sentença:
"Trata, sim, de casos em que independentemente da rescisória, pode promover-se a desconstituição dos atos judiciais. A palavra "rescindidos"está aí, por"anulados": a impropriedade terminológica já fora apontada pela doutrina, em relação ao Código anterior, e tem outros antecedentes, como o texto do artigo 255 do Regulamento 737, que falava em"ação rescisória do contrato".
Assinala que a ação visa à anulação de atos praticados no processo, "aos quais ou não precisa seguir-se decisão alguma, ou se segue decisão homologatória, que lhes imprime eficácia sentencial, que os equipara, nos efeitos, ao julgamento da lide".
Concluindo:
"A ação dirige-se ao conteúdo (ato homologado), como que atravessando, sem precisar desfazê-lo antes, o continente (sentença de homologação).
No mesmo sentido a lição de Hamilton Moraes e Barros em comentário ao citado art. 1.029:
"A ação para anular sentenças homologatórias de partilha e de divisões, em que não houve contestação, é a anulatória, ou ação de anulação, e não a rescisória propriamente dita. A competência para as ações de anulação de partilha amigável é do juiz de primeira instância" .
(...)"
(In Inventários e Partilhas - direito das sucessões: teoria e prática - 21ª ed. rev. e atual. - São Paulo: Livraria e Editora Universitária de Direito, 2008, pp. 464-465 - grifou-se)
Esses doutrinadores corroboram, inclusive, o entendimento defendido por Orlando Gomes que, inclusive, está transcrito no v. acórdão vergastado, o qual, no entanto, não foi adotado porque a eg. Corte local entendeu pela não ocorrência da partilha amigável. Assim, é cabível a presente ação anulatória para desconstituir partilha amigável, no caso em liça.
Nesse sentido, confiram-se os seguintes precedentes:
"CIVIL E PROCESSO CIVIL. INVENTÁRIO. SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA DE PARTILHA. DESCONSTITUIÇÃO. AÇÃO ANULATÓRIA. CABIMENTO. LEGITIMIDADE PASSIVA DE QUEM PARTICIPOU DA PARTILHA. ARTS. ANALISADOS: 486, 1.030 E 12, V, CPC.
1. Ação anulatória de partilha distribuída em 06⁄08⁄2002, da qual foi extraído o presente recurso especial, concluso ao Gabinete em 15⁄04⁄2013.
2. Discute-se a ação adequada para desconstituir a partilha homologada por sentença nos autos do inventário, assim como a legitimidade dos herdeiros para figurar no polo passivo.
3. A análise da ação adequada à invalidação da partilha tem por pressuposto a análise do conteúdo e dos limites da sentença proferida nos autos do inventário: se homologada, simplesmente, a partilha, mesmo que para aprovar o plano apresentado pelo inventariante, mas desde que ausente litigiosidade, deve-se ajuizar a ação anulatória; se, ao revés, na sentença forem resolvidas questões suscitadas pelos interessados quanto à divisão de bens e⁄ou à admissão de herdeiros, cabível é a ação rescisória.
4. Na espécie, a invalidação pretendida na ação anulatória é do ato homologado e não da sentença homologatória, porquanto ficou demonstrado nos autos que, ao elaborar as primeiras declarações e o esboço de partilha, a inventariante (recorrente), intencionalmente, omitiu a condição de meeira da então companheira do falecido, embora a tenha indicado na petição inicial do inventário, preterindo, assim, o seu direito à meação.
5. Transitada em julgado a sentença que homologou a partilha, cessa o condomínio hereditário e os sucessores passam a exercer, exclusiva e plenamente, a propriedade dos bens e direitos que compõem o seu quinhão, nos termos do art. 2.023 do CC⁄02. Não há mais falar em espólio, sequer em representação em juízo pelo inventariante, de tal forma que a ação anulatória deve ser proposta em face daqueles que participaram da partilha; na espécie, a filha (recorrente) e a ex-mulher do falecido.
6. Recurso especial conhecido e desprovido."
(REsp 1.238.684⁄SC, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 3⁄12⁄2013, REPDJe de 21⁄2⁄2014, DJe de 12⁄12⁄2013)
"PROCESSUAL CIVIL. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO DISPOSITIVO LEGAL. SÚMULA N. 284⁄STF. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. NÃO-OCORRÊNCIA. ANULAÇÃO. PARTILHA AMIGÁVEL. DISCUSSÃO DE ERRO OU DOLO.
(...)
3. A sentença que se limita a homologar a partilha amigável não pode ser desconstituída por meio de recurso de apelação, pois não possui cunho decisório e há necessidade de produção de prova acerca do vício alegado, sendo necessário o ajuizamento da ação anulatória prevista no art. 1.029 do CPC.
4. Recurso especial conhecido em parte e provido."
(REsp 695.140⁄MG, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUARTA TURMA, julgado em 1º⁄9⁄2009, DJe de 14⁄9⁄2009)
Nesse cenário, sendo cabível a ação de anulação da partilha amigável, é imperioso reconhecer que o pedido posto na exordial (fls. 4-8) não é juridicamente impossível, motivo pelo qual deve ser reformado o v. acórdão estadual, reconhecendo-se que não está caracterizada a carência da ação.
Insta salientar, também, que a solução ora adotada é corroborada pelo d. Ministério Público Federal, de cujo irretocável parecer da lavra do em. Subprocurador-Geral da República, Dr. Pedro Henrique Távora Niess, transcreve-se o seguinte excerto, adotando-o como razões de decidir (fl. 209):
"2. O artigo 1031, do Código de Processo Civil, deixa claro que, tal como a partilha amigável, à adjudicação aplica-se o que nele está disposto.
No caso em exame os herdeiros recorridos, de comum acordo, abriram mão da herança em favor da viúva, dando ensejo à adjudicação dos bens, uma vez que ela se tornou a única herdeira.
Com razão, pois, os recorrentes, que discordam da solução encontrada pelo E. Tribunal a quo que reconheceu, mesmo diante dessas circunstâncias, "partilha judicial", só passível de rescisão, não de invalidação pelo meio utilizado, decretando a carência de ação, dada a impossibilidade jurídica do pedido.
O artigo 1031, do Diploma Processual Civil, restou, assim, malferido."
Ante o exposto, dou provimento ao recurso especial, para restabelecer a sentença.
É como voto.
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
QUARTA TURMA
Número Registro: 2005⁄0203859-0
PROCESSO ELETRÔNICO
REsp 803.608 ⁄ MG
Números Origem: 10024010964401 24010964401 24896217924
PAUTA: 20⁄03⁄2014
JULGADO: 25⁄03⁄2014
Relator
Exmo. Sr. Ministro RAUL ARAÚJO
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro RAUL ARAÚJO
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. HUGO GUEIROS BERNARDES FILHO
Secretária
Bela. TERESA HELENA DA ROCHA BASEVI
AUTUAÇÃO
RECORRENTE : WARLEY DE ARAÚJO E OUTROS
ADVOGADO : MARIA HELENA DO CARMO E OUTRO
RECORRIDO : MÁRCIO PEREZ E OUTROS
ADVOGADO : CAMILO EUSTÁQUIO REZENDE LIMA
ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Sucessões - Inventário e Partilha
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia QUARTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Quarta Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Maria Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira, Marco Buzzi e Luis Felipe Salomão votaram com o Sr. Ministro Relator
Disponível na Jurisprudência do IBDFAM, do Dia 19 de Janeiro de 2015